Camões: Lopes Vieira e o Cinema


Rodado em 1946, produzido por António Lopes Ribeiro, realizado por Leitão de Barros, com música do Maestro Ruy Coelho, o argumento é de Afonso Lopes Vieira, que nesse ano faleceria e a quem o filme, foi, por isso, dedicado. [tendo dificuldade em visionar no blog, clicar aqui para ver no Youtube; são 115 minutos de película]-

De um texto de Maria do Rosário Lupi Bello permito-me citar este longo excerto [texto integral aqui], porque elucidativo da obra: 

«Dentre as várias obras cinematográficas portuguesas (curtas e longas metragens) baseadas na figura e na obra de Luís Vaz de Camões, uma sobressai, tanto pelo imediato sucesso que granjeou, quanto pelo valor simbólico que lhe foi atribuído: trata-se do filme a preto e branco, de 115 minutos, intitulado Camões (com o subtítulo Erros meus, má fortuna, amor ardente) realizado por Leitão de Barros e estreado no dia 23 de Setembro de 1946, no cinema S. Luís, em Lisboa. Com argumento do realizador e de Afonso Lopes Vieira (que morreu nesse mesmo ano e a cuja memória o filme é dedicado), produzido por António Lopes Ribeiro e protagonizado por António Vilar, o filme recebeu, desde a primeira hora, o aplauso da crítica e do público, que chegaram mesmo a defini-lo como a melhor obra do nosso cinema até à data. O Governo português de então considerou-o de “utilidade pública”, tendo o filme ganho o grande prémio do Secretariado Nacional de Informação nesse mesmo ano, bem como vários prémios para o desempenho dos principais actores: Prémios do SNI para o melhor actor, António Vilar (Luís de Camões) – aqui num dos melhores desempenhos da sua brilhante carreira -, para a melhor actriz, Eunice Muñoz (Beatriz da Silva), e menções honrosas para Vasco Santana (o Mal-Cozinhado) e Paiva Raposo (Pero de Andrade Caminha). Carmen Dolores representa dois breves papéis, nas figuras de Catarina de Ataíde e Natércia, e Igrejas Caeiro dá corpo a André Falcão de Resende. Camões foi apresentado oficialmente no Festival de Cannes de 1946 e permanece como uma obra de referência no contexto do cinema português dos anos 40. Trata-se, de facto, de um filme que logra desenvolver de modo relativamente elaborado e feliz os códigos da tendência da época, de cariz histórico-literário melodramático (como diria Luís de Pina), chegando a um grau de apreciável, quase barroca, sumptuosidade, no que ao guarda-roupa e cenários diz respeito, e sabendo manter um ritmo narrativo bem articulado e eficiente do ponto de vista dramatúrgico. Fazendo do jovem Camões um verdadeiro e irreverente Don Juan, em permanente despique literário e amoroso com Pero Andrade Caminha (o qual vem a reconhecer a supremacia artística do autor de Os Lusíadas), passando pelo retrato dos seus momentos de glória enquanto poeta maduro e testemunhando o final de miséria e abandono da sua vida, o filme incide sobretudo na glorificação patriótica do povo representado na epopeia de Os Lusíadas e identificado com a grandeza do seu autor, dando assim voz à exaltação da História de Portugal.»